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Pistolas Japonesas Nambu

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Introduzida no Japão em 1925, a pistola semi-automática Tipo 14 foi utilizada nas campanhas da guerra Sino-Japonesa e em todas as áreas desse conflito, através das numerosas ilhas do Pacífico. Seu projeto remonta do projeto original do então Coronel do Exército Imperial Japones, Kijiro Nambu, em 1902 e lançada em 1904. Esta antiga pistola era demasiadamente complicada e de difícil e dispendiosa fabricação, situação bem diferente do que era exigido: produção em massa e baixo custo.

Kijiro Nambu nasceu em 1869 e faleceu em 1949. Durante sua longa vida na carreira militar, foi uma das peças-chave e responsável pelo desenvolvimento de várias armas, inclusive metralhadoras leves. Em 1897 foi comissionado no Tokyo Arsenal, participou do desenvolvimento do fuzil Tipo 30 e do revólver Tipo 26, até sua promoção à major, quando foi incumbido de desenvolver uma pistola semi-automática. Embora seja comparado, algumas vezes, ao grande inventor norte-americano John Browning, temos sempre que levar em conta que os projetos deste último primavam pela confiabilidade e resistência, enquanto os de Nambu eram complicados e dotados de soluções, algumas vezes esdrúxulas.

Essa exigência levou o Cel. Nambu a modificar e melhorar bastante o projeto original, originando então a bem mais conhecida e famosa pistola Tipo 14. Essa designação “14” leva-nos a uma pequena confusão. Ela é originária da inscrição, em ideogramas japoneses, existente nessas armas, do lado esquerdo da armação: “Shiki Nen Jushi” , que significa literalmente “Modelo Ano 14”, o ano japones em que a arma foi adotada. Os japoneses usaram diversos calendários por várias centenas de anos, mas o sistema utilizado na época dessas armas era baseado na data em que o último Imperador havia sido coroado. Uma vez que a pistola foi adotada no 14º ano de reinado do Imperador Taisho, levou por isso a nomenclatura 14, embora fosse o ano de 1925 no calendário Gregoriano.

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A pistola Nambu Tipo 14

A bem da verdade, a Tipo 14 não foi oficialmente adotada como arma curta padrão do Exército Imperial Japonês. O que se esperava era que os oficiais japoneses a adquirissem por conta própria, o que nem sempre ocorria. Há vários relatos durante a II Guerra Mundial de que oficiais japoneses, pelo menos os que podiam se dar ao luxo de fazê-lo, adquiriam armas ocidentais para serem utilizadas como sua arma pessoal, pois mesmo entre eles acreditava-se que essas armas eram mais confiáveis que a Tipo 14.

O desenho era claramente inspirado nas pistolas alemãs Parabellum (Luger) produzidas desde 1900, das quais a Nambu herdou o formato e o ângulo de inclinação da empunhadura, a peça que serve de base do carregador, o guarda-mato circular e até o cartucho que disparava. Porém, as semelhanças terminam por aí. Mecanicamente, são armas completamente diferentes. A Nambu não utiliza o peculiar ferrolho articulado como nas Lugers. Na verdade, usa até uma solução muito mais simples; um ferrolho feito em uma só peça e com uma mola recuperadora posicionada do lado esquerdo do mesmo.

Projetada para usar o cartucho 8mm, era uma pistola de curto recuo de cano e de culatra trancada (locked-breech), apesar de que este cartucho era bem menos potente que seu similar alemão, o 7,65mm Parabellum, se bem que de dimensões quase idênticas.

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(Foto) Os cartuchos 7,65mm Parabellum e 8mm Nambu – praticamente idênticos.

A produção em massa iniciou-se em 1906, sendo que os maiores fabricantes foram o Arsenal de Tóquio e a Tokio Gas and Electrical Company. Até o final da II Guerra, estima-se em 270.000 armas produzidas, apesar de que várias foram destruídas, completas ou ainda em processo de fabricação, pelas forças de ocupação norte-americanas. Não se trata de uma quantidade  considerável, quando se lembra de que a pistola Colt 1911 teve um número superior a 2.700.000 armas fabricadas.

Apesar de ser considerada a melhor arma curta utilizada pelo Exército Japonês, principalmente nos anos do conflito contra os Estados Unidos, sua produção em larga escala sofreu severamente com problemas de qualidade, e os últimos e inúmeros exemplares capturados pelos americanos demonstravam uma arma mal feita, mal acabada e insegura. Comparada às armas utilizadas pelos demais países participantes da II Guerra, como as norte-americanas Colt 1911 e as alemãs Walther P38, até mesmo com as Tokarev russas, as Nambu eram, sem dúvida, armas bem inferiores.

Seu projeto apresentava vários problemas sérios: o cartucho era muito fraco, bem inferior ao .45ACP, ao 9mm Parabellum e ao 7,62mm Tokarev. Sua trava de segurança era praticamente inútil. Sua localização, acima do gatilho e necessitando ser girada em 180 graus para ser ativada, não permitia a utilização de uma só mão. Também fazia muita falta um dispositivo para manter a culatra aberta após o último disparo, condição primordial em campo de batalha. Sem ele, os atiradores nunca podiam saber, ao certo, quando a munição havia acabado a não ser que dessem um disparo “a seco”. Uma coisa, pelo menos, era animadora: a pistola tinha boa precisão de tiro e um bom balanço, com peso bem distribuído e coronha anatômica e confortável. A capacidade do carregador era de 8 cartuchos.

Os modelos iniciais

Para se entender melhor a evolução da pistola Nambu, o modelo original de 1902 era chamado de Tipo A. Este modelo tinha duas variações; a apelidada de “Grandpa Nambu” e a 1902 modificada que era chamada de “Papa Nambu”. A posterior Tipo 14 foi a que substituiu a Tipo A, na década de 20. Foram feitas cerca de 2.500 “Grandpa”, que eram armas de muito boa qualidade e acabamento esmerado. A peça que serve de base do carregador era feita de chifre, posteriormente de madeira; a arma permitia a instalação de uma coronha de madeira, nos moldes das Parabellum e das Mausers C-96.  Possuía também, na parte traseira da armação, uma alça para fixação de uma correia ou cordão de segurança, acessório muito comum em quase todas as pistolas e revólveres de uso militar ou policial.

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Pistola Papa Nambu, modelo modificado da 1902

A “Papa Nambu” , que é a 1902 modificada, é muito similar à “Grandpa” mas agora possuía uma alça, desta vez móvel, para  a fixação da correia de segurança e a base do carregador era em alumínio. Importante, dentre outras diferenças de menor impacto, foi a adoção de uma trava de segurança posicionada na empunhadura, logo abaixo do guarda-mato. Por essa razão, este modelo não tinha a trava giratória posicionada acima do gatilho.Por volta de 10.000 armas deste tipo foram produzidas.

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A “Papa Nambu” de 1904, com a alça de correia do tipo móvel e a trava de segurança na parte dianteira da empunhadura. Este modelo conta com um encaixe para coronha na parte posterior da empunhadura e alça de mira regulável. Foi a mais bem acabada e superior em qualidade dentre os modelos da Nambu.

A variação denominada de  “Baby Nambu” também era muito interessante; uma versão mais leve, menor e utilizando um cartucho mais fraco ainda, o 7mm Nambu. É a versão das Nambu mais cobiçadas por colecionadores e somente 6.500 peças foram feitas. Acredita-se que os oficiais que serviam em veículos, como tanques, as preferiam ao invés da Tipo 14 por ser menor e mais facilmente manuseada.

 A Tipo 14 (1925)

A Tipo 14 foi a evolução da 1902. Kijiro Nambu foi solicitado a resolver os problemas dos modelos anteriores mas, principalmente, oferecer uma opção mais simples e mais barata de se fabricar. Com isso, eliminou alguns “luxos” como a trava de empunhadura e simplificou alguns aspectos internos da arma para facilitar processos dispendiosos de usinagem. Acrescentou-se também uma segunda mola recuperadora, do lado direito, aliviando com isso a pressão do ferrolho sobre um lado só da arma e utilizando molas mais fracas e menores.

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A pistola Tipo 14, produção pré II Guerra, ainda com um  acabamento razoável. Note que a partir desta época a maioria delas era fabricada com o guarda-mato alongado, para permitir o uso de luvas.

Apesar dos problemas de projeto já comentados acima, a Tipo 14 acabou herdando quase todos eles do modelo 1902. Porém, já possuía um dispositivo de segurança muito pouco comum em pistolas, e que era usado nas Brownings 1910 e 10/22: uma trava de carregador. Esse dispositivo evitava que, com o carregador removido da arma, fosse possível dispará-la. Interessante também era uma mola de aço, que é protuberante na parte dianteira da empunhadura, que servia para manter o carregador tensionado dentro da arma e não deixasse cair ao chão quando o botão era pressionado. Isso significa que o carregador teria mesmo que ser puxado para fora.

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Vista explodida da pistola Tipo 14 – a peça em forma de um pêndulo que se vê abaixo da culatra é a trava do ferrolho. Este modelo não possuía a mola de retenção do carregador.

A desmontagem da pistola era, de certa forma, simples e sem uso de ferramentas. Introduzia-se um objeto em forma de pino pressionando a parte posterior do percussor, que se sobressai pelo grande botão do ferrolho. Desta forma, é possível desatarraxar este botão e retirar pela parte traseira o pino guia, a mola e o percussor.

Com o carregador removido, pressione a ponta do cano sobre uma superfície rígida para fazê-lo recuar e pressione o botão de liberar o carregador. Puxe o conjunto gatilho e guarda-mato para baixo (deslizando pela empunhadura). A seguir alivie a pressão sobre o cano e todo o conjunto superior da arma pode ser retirado pela frente. Essa desmontagem parcial podia ser feita, para limpeza interna da arma, mesmo em campo.

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Vista em “Raios-X” da Tipo 14 onde se nota alguns componentes interessantes: a mola de retenção do carregador, na parte inferior da empunhadura; a trava da culatra, posicionada logo atrás do topo do carregador, em sua posição trancada. Com o recuo do cano, esta peça basculava para dentro de um espaço vazio na parte posterior da armação e com isso, liberava o ferrolho para que fosse aberto.

Justiça seja feita à essa arma: apesar de ter granjeado péssima reputação, mesmo dentro do próprio Exército Japonês, após a II Guerra os Estados Unidos chegaram a fazer testes com vários modelos da arma, em 1948. A conclusão que chegaram foi a de que o maior problema da pistola não residia em seu projeto, e sim na qualidade de manufatura e dos materiais. As armas testadas que não eram de produção do final da guerra funcionaram a contento e com índice baixíssimo de problemas. A arma enfrentava bem as adversidades como areia, neve, umidade e maus tratos.

A pistola Tipo 14 desmontada – note a interessante montagem do guarda-mato, através de trilhos existentes na armação.

Um fato curioso é que Bill Ruger, fundador da famosa fábrica de armas norte americana Sturm, Ruger & Co., adquiriu por poucos dólares, de um “marine” recém desembarcado em terras americanas, uma Nambu Tipo 14. Inspirado nela, mas sem dúvida com muito melhor estética, criou inicialmente em sua oficina de casa, um protótipo em calibre .22 Long Rifle, que depois, em 1949,  veio a se tornar a pistola Ruger Standard, um sucesso de vendas e que alavancou a Sturm & Ruger Arms Co. à posição de grande fabricante de armas até os dias de hoje.

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A pistola Ruger Mark I, sucessora do modelo Standard lançado pela Ruger Arms em 1949

A pistola modelo 94 (1935)

Essa pistola detém o título de “a pior pistola já fabricada” e, infelizmente, isso não é tão injustificado assim. A bem da verdade, dentro do contexto de época e local onde foi desenvolvida, ela realmente dava conta e cumpria com o que a ela foi designado. Várias soluções nela empregadas chegavam a ser derivadas de diversos projetos de pistolas semi-automáticas existentes em sua época.

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As duas faces de uma das mais esquisitas e estranhas armas já projetadas. Na verdade o não usual formato da empunhadura  é o que mais salta aos olhos, sendo que o restante da arma até que se pode considerar “normal”.

Em 1924, Kijiro Nambu se retirou do Exército para se dedicar a negócios próprios, fundando inclusive uma empresa voltada ao mercado de armas de fogo, a Nambu Rifle Manufacturing Co. Apesar da popularidade da Tipo 14, por volta de 1934 ele foi procurado por uma comissão do Exército Japonês para desenvolver uma nova pistola semi-automática, mas que fosse menor e mais portável que a Tipo 14. No ano do então calendário japonês de 2594, Nambu apresentou a sua nova arma, a Tipo 94.

O desenho era totalmente novo. Nambu manteve o sistema de culatra trancada, utilizando um bloco móvel de aço sob a culatra. O cartucho utilizado se manteve o mesmo 8mm da Tipo 14. O desenho da empunhadura nos remete a um usuário de mãos bem pequenas, mas alguns autores insistem na estatura média de um soldado japonês, que eram, na verdade, pequenos. Manteve-se na arma uma engenhosa trava de carregador, uma pequena peça que surgia por traz do gatilho e o travava no seu curso, assim que o carregador fosse removido.

A arma possuía um sistema de manter a culatra aberta após o último disparo, mas não nos moldes mais aceitáveis e muito mais usados, no qual mesmo se retirando o carregador, o ferrolho permanece aberto. Na Tipo 94, ao se retirar o carregador, o ferrolho se fechava, forçando o atirador a rearmá-lo após inserir um carregador municiado.

O ferrolho era feito em duas peças. A peça que recuava propriamente dita tinha como dispositivo de parada uma pequena lingueta transversal, algo considerado frágil, mesmo tendo em conta que o cartucho era fraco e a arma possuía uma trava de culatra. A desmontagem era um pouco mais complicada que a Tipo 14 e aí poderia ocorrer algo perigoso: na remontagem, a arma poderia ser completamente montada sem a trava de culatra. Como se tratava de uma peça pequena, seria até fácil perdê-la num local confuso e nem se dar conta dela ao montar. O resultado podia ser catastrófico pois a pistola se converteria numa “blow-back”, ou seja, o ferrolho poderia ser ejetado para fora da arma bem na direção do rosto do atirador.

A arma possuía agora uma tecla de trava de segurança em um lugar mais adequado que a Tipo 14. Uma pequena alavanca na parte posterior da culatra, do lado esquerdo, com um movimento curto para cima e para baixo. Aí se liam os ideogramas “ka” (fogo) e “an” (seguro).

Porém, mesmo assim, segurança não era o forte desta arma. Haviam vários problemas sérios, um deles já citado acima quanto à desmontagem parcial.

A pistola Tipo 94 desmontada parcialmente.

Além disso, o “sear“, que é uma peça que conecta o gatilho de uma arma ao seu percussor ou cão, a fim de efetuar o escape do mesmo e disparar a arma, era montado externamente, no lado esquerdo da arma. Quando a arma estava desengatilhada, essa peça faceava a lateral da armação. Porém, ao se engatilhar, ela se tornava um pouco protuberante, como uma espécie de degrau. Se, inadvertidamente, essa peça sofresse uma pressão sobre ela, fosse pelos dedos, ao se colocar a arma num coldre apertado ou mesmo depositar a arma sobre uma mesa com certa violência, acarretaria o disparo da mesma. Acredita-se que esse tipo de acidente deve ter ocorrido com certa frequencia em campos de batalha. O “sear” exposto não era exclusividade da 94. Os entendidos bem sabem que a Parabellum (Luger) também tinha este mesmo problema, só que de forma muito mais protegida e virtualmente impossível de disparo acidental.

Finalmente, o dispositivo que efetua o desengate do gatilho do “sear” mencionado acima, cuja função é evitar que a arma dispare antes de estar totalmente com a culatra trancada, com o tempo, se desgastava por fadiga de material. Nestes casos, poderia ocorrer um disparo nesta situação, com iminente perigo para o atirador.

Enfim, o que se deve levar em conta é que hoje em dia a Tipo 94 pode ser uma peça interessante para coleção, mas definitivamente é arriscado ser municiada e utilizada. Principalmente com as fabricadas no final da II Guerra, a atenção deve ser redobrada.

Algumas publicações afirmam que a Tipo 94 foi vendida para uso civil em alguns países da América do Sul, fato que o autor nunca confirmou. Na verdade, pelo menos no Brasil, as 94 são armas difíceis de se encontrar. Na era pré-guerra, a América do Sul estava bem suprida de armas ocidentais, desde as bem baratas e de má qualidade, como os revólveres e garruchas espanhóis e belgas  como as de qualidade superior, a maioria proveniente do mercado norte-americano. Porém, China e Taiwan são países que chegaram a utilizá-la em maior quantidade.

Apesar da popularidade da arma junto aos oficiais do Exército, ela nunca foi considerada taticamente importante em batalhas. Num exército onde os oficiais se sentiam mais seguros usando tradicionais espadas e outras armas de lâmina de herança de família, uma arma como esta, de precisão medíocre e qualidade duvidosa, era mais um “traste” para ser carregado ou útil para se cometer suicídio em caso de ser aprisionado, do que algo em que se poderia confiar a vida em um campo de batalha.

Written by Carlos F P Neto

27/08/2009 às 14:16

4 Respostas

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  1. Danilo, saudações. Realmente as Nambu são bem raras por aqui, muito mais que as Lugers, por exemplo. Já tive algumas em mãos, pouquíssimas, de posse de colecionadores. Para negócio, nunca vi uma até agora. Abraços.

    Carlos F P Neto

    20/10/2017 at 14:59

  2. Caro Sr Carlos! Ouço falar pouquíssimo sobre estas pistolas Nambu! Existem exemplares aqui no Brasil? É muito difícil adquirir uma para CR de coleção? Desde já agradeço a atenção!

    Danilo Martins

    20/10/2017 at 13:12

  3. Obrigado, prezado Joaquim; continue nos prestigiando.

    Carlos F P Neto

    13/05/2013 at 8:44

  4. Quando comecei ler o artigo achei ela muito parecida com a ruger, achei interessante a ruger ser derivada da nambu, Parabéns pelo artigo.

    Joaquim do Prado

    12/05/2013 at 18:39


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